Enquanto tirava fotos de nuvens ciganas no céu de Nova Friburgo, o fotógrafo pernambucano Cafi flagrou o descanso de dois amigos à beira de uma estrada. A imagem foi parar na capa do vinil de Clube da Esquina.

Apesar da diferença de idade de 10 anos entre Bituca e Lô, a semelhança física dos personagens da foto e os músicos fez a lenda de que os fotografados eram, de fato, Milton e Lô, perdurar por quarenta anos. Um dos discos mais importantes da cultura brasileira é também dono de uma das mais icônicas capas de disco da nossa música.

Em 2017 vimos duas capas fazerem reverência ao Clube da Esquina, disco de Milton Nascimento e Lô Borges, de 1972.

Djonga

Lançado em março, o primeiro disco do rapper mineiro Djonga é uma homenagem explícita à capa do Clube.

A capa traz o rapper duplicado, na mesma pose dos garotos, com atenção aos detalhes: o primeiro Djonga sorri e está descalço com o pãozinho na mão. O segundo está sério, de tênis com as mãos por cima dos joelhos.

O trabalho é assinado por Daniel Assis (foto) e Bruna Serralha (tratamento/fusão/arte), sócios do 176studio.

Djonga e a referência (Reprodução/Instagram)

Casa de Bituca

Saindo do rap e indo até o choro, o Hamilton de Holanda Quinteto lançou em abril Casa de Bituca, disco quase todo instrumental que passeia pelo universo de Milton Nascimento. 

Carioca de nascimento, Bituca mudou-se para Três Pontas ainda criança, e soube cantar como poucos o que significa ser mineiro – essa coisa difícil de explicar. 

Assim como o disco, a imagem que ilustra Casa de Bituca busca fazer uma referência direta, mas não óbvia, ao universo de Milton. Para mim, como mineira, foi impossível não enxergar nessa foto as inúmeras casinhas do Maquiné, Ravena, Barão de Cocais, Caeté e Santa Bárbara, lugares onde meus pais e avós nasceram e foram criados. 

Desde então também ficou difícil andar de carro pela Serra do Cipó ou Oliveira sem encontrar diversas casas de bituca pelas estradas de terra. 

Foi difícil achar o fotógrafo Rafaê Silva nas interwebs, viu? Isso porque a imprensa insiste em creditá-lo como Rafael Silva nas fotos de Hamilton de Holanda Quinteto e outros artistas da música.

O Rafaê me relatou por e-mail aquela que é a mais incrível de todas as coincidências: 

“A ideia inicial deles até então seria uma casinha de passarinho João de Barro. Depois conversamos bastante e o Marcos [Portinari, empresário do grupo] me pediu uma foto de algumas casas de inteiro, casas soltas pela florestas também. A foto foi feita em uma casa muito especial em Lumiar. Foi feita em película 35 mm eu só tinha 3 fotos no filme e foram exatamente as 3 fotos que tem”.

Lumiar, o lugar onde esta foto foi tirada é um dos distritos de Nova Friburgo. Foi nesse caminho de região serrana de mata atlântica, na separação entre Rio e Belo Horizonte, que Cafi registrou tantas imagens que foram parar em alguns encartes do clube. 

Tonho e Cacau

Publicado originalmente em 15 de março de 2012, o caderno especial do Jornal Estado de Minas fez uma homenagem aos 40 anos do lançamento que pegou até Milton e Lô (os reais oficiais) de surpresa. O grande destaque era a reportagem de Ana Clara Brant (sobrinha de Fernando Brant, também do Clube) que relata a busca pelos dois meninos desconhecidos. 

A busca envolveu uma viagem a Nova Friburgo, a ajuda de 53 pessoas, anúncio numa rádio local e algumas reviravoltas. O reencontro dos amigos de infância foi registrado pelo fotógrafo do jornal, Túlio Santos. Tonho, o “Lô” da foto, trabalhava a um quarteirão do hotel onde estava a equipe do jornal. 

“Alguém do carro me gritou e eu sorri. Estava comendo um pedaço de pão que alguém tinha me dado, porque eu estava morrendo de fome, e para variar descalço. Até hoje não gosto muito de usar sapato. Mas nunca soube que estava na capa de um disco. A minha mãe vai ficar até emocionada. A gente nunca teve foto de quando era menino”.

Cacau, o “Milton”, mudou-se para Rio das Ostras, mas foi até Nova Friburgo para passar a história a limpo. Ele contou à reportagem que não se lembrava do exato momento da foto, mas que anos depois, em Macaé, se deparou com a capa do Clube da Esquina e desconfiou. 

“Coloquei a mão sobre a minha foto e fiquei reparando aquele olhar. Achei que era eu mesmo e acabei comprando o CD, porque o LP não tinha mais. Até queria um para poder guardar”.

Para ler a reportagem completa, é só clicar aqui.