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António Zambujo – Até pensei que fosse minha (Portugal, 2016).
Azulejo de Adriana Varejão.

Sempre que surge o assunto Portugal e Brasil na minha vida, eu digo que aprendi que os portugueses têm uma relação de amor e ódio com o Brasil. Na farta parcela de pessoas além-mar que ~amam~ o Brasil e veem o nosso país como terra prometida (principalmente durante a recente crise econômica portuguesa e antes da nossa crise institucional golpista), fica evidente que esta relação é, muitas vezes, desigual. Não percebemos, em nosso dia-a-dia, a quantidade de tradições portuguesas que acabaram ficando por aqui depois da invasão e dos anos de exploração. Mas o Brasil é pauta em Portugal todos os dias! Quando morei em Lisboa, entre 2010 e 2011, não houve um dia em que eu não pensasse ou falasse de Minas Gerais, pão de queijo, nossa receita de bacalhoada, e que eu não conheço a floresta amazônica.

Na música, essa relação vai desde a rapper Capicua, mencionando Elis Regina, e Sam The Kid, sampleando Maria Bethânia, até à cena alternativa, que idolatra e regrava Marcelo Camelo e o considera um grande compositor. Mas mais do que isso: a forma quase orgânica como os nossos cancioneiros se esbarram sem a gente nem saber. Como Carminho reverencia Milton Nascimento. Como as canções de Chico Buarque – bem mais que Fado Tropical – dialogam com o fado e com a música popular portuguesa. A saudade e o amor romântico como tema central dos dois universos.

É possível ver esta relação em tantos âmbitos (na literatura, no hip hop tuga, nos filmes, na minha cantora favorita), que eu poderia ficar até amanhã aqui colando links e referências neste texto. Não pude conter o sorriso ao descobrir, pelo instagram, que, não bastasse lançar um disco com 16 regravações de Chico Buarque, António Zambujo imprimiu na sua capa uma referência que conhecemos muito bem. O encarte de Até pensei que fosse minha tem assinatura de Adriana Varejão. São recortes da obra Celacanto Provoca Maremoto (2004 – 2008), em que vemos um ícone do barroco mineiro e da arte portuguesa, o azulejo, destruído. A galeria com nome da artista plástica carioca foi a semente do Inhotim, museu de arte contemporânea em Brumadinho. 

Reprodução: Inhotim/Facebook

É tão corriqueiro ver ruas e lugares de outros países impressos nas capas, que dá orgulho ouvir música brasileira com sotaque português. E mais: da próxima vez que formos ao Inhotim, vamos encontrar a capa do disco de António Zambujo.